74 ANOS DA MORTE DE TROTSKY: A TRAIÇÃO DO LEMA “TODO PODER AO SOVIET”.
RESUMO: Em homenagem aos 74 anos da morte de Trotsky, o texto
elabora 3 perguntas: “o que é soviete (conselho)?”; “como o segundo homem da
revolução russa (Trotsky) pode ser traído?” e “qual o legado de Stálin”, de
modo que ao buscar responde-las, dirige-se à análise sobre como se deu a
traição ao lema “todo poder ao soviete”.
1. Trotsky e o Soviete:
Soviete! O que é isso? Incrível que os que se dizem comunistas não sabem.
Deve ser a brutalidade do “homem de aço”, que é o significado da palavra
Stálin. É uma nova forma de organização e agremiação para fazer a política.
Certos resquícios remontam a Comuna de Paris, mas o soviete melhor elaborado
surgiu durante a greve geral de outubro na Rússia, em 1905. O primeiro soviete
que surgiu foi o de São Petersburgo, sob a vice-presidência de Trotsky. Ou
seja, Soviete significa conselhos - seriam os conselhos de soldados, de
trabalhadores, de camponeses etc.
Stalin e seguidores (inclusive Kurchev) sufocaram a vida política em toda a
URSS, de modo que a vida política ficou paralizada nos próprios sovietes. O que
ocorreu foi que uma elite da classe operária (falseando os sovietes) era de
tempos em tempos convocada a reuniões para aplaudir os discursos dos chefes e
votar por unanimidade as resoluções que lhe são apresentadas. Usando as palavras de uma comunista que
acertou na visão do quadro, mas errava gravemente em suas táticas e
estratégias, Rosa Luxemburgo dizia que se tratava de uma ditadura, mas não do
proletariado. Era a ditadura de um punhado de politiqueiros, isto é, uma
ditadura no sentido burguês.
E mais importante: para você ter uma ideia do esvaziamento completo dos
sovietes, durante o governo de Stálin, o próprio Congresso do Partido Comunista
passou mais de 10 anos sem se reunir. Para votar unanimemente as resoluções e
aplaudir os discursos, bastavam as reuniões do comitê central.
2. Como Trotsky, que era Comandante Supremo do Exército Vermelho, Indicação
de Lênin para ser Secretário-Geral, Orador que empolgava as Massas, Pode ser
Traído?
Muita gente ainda hoje se pergunta como pode acontecer que Trotsky viesse ser
traído, silenciado, desterrado e por fim assassinado por aquele homem de ferro
(tradução do termo Stálin) grosseiro, medíocre e obstinado, que se chamava
Stálin.
Trotsky era o Chefe do Comitê Militar Revolucionário, o homem que, por meio
da revolução, apoiado nos soldados e marinheiros revolucionários, tomou o poder
junto e integrado com os bolcheviques no dia 7 de novembro de 1917; Trotsky o orador cujo verbo fulgurante incendiava de
entusiasmo massas populares; Trotsky, o
homem que no primeiro governo comunista do Mundo assumiu o segundo posto
principal, que era o de Ministro da Guerra (tendo à sua frente apenas Lênin), e
de quem, ainda em 1922, dizia Lênin que era talvez “o homem mais capaz do atual
Comitê Central”.
O segredo do triunfo de Stálin sobre tudo e sobre todos se
acha no fato de que ele colocou a serviço de suas ambições pessoais o aparelho
do Partido Comunista e a polícia secreta. Enquanto Trotsky, por exemplo, tinha sérias divergências com Lênin, Stálin se portava como o mais fiel e subserviente leninista. Por esse meio foi colocando
seus homens nos postos do partido e
da polícia, para depois mata-los, tudo em nome do leninismo e da defesa de Lênin.
da polícia, para depois mata-los, tudo em nome do leninismo e da defesa de Lênin.
Em verdade, o próprio Lênin se deixou enganar por Stálin. Apesar de toda a sua experiência de revolucionário que viveu boa
parte da vida na clandestinidade, Lênin era um homem de boa-fé. Lembre-se do caso
do espião Malinovski, que se fez amigo íntimo e pessoa de absoluta confiança de
Lênin, ao ponto de, por sua interferência, ter chegado a membro do Comitê
Central do PC russo. Em relação a
Stálin, verificou-se a mesma boa-fé, tendo como conseqüência o mesmo engano.
Ocorre ainda que Lênin não gozava boa saúde, desde 1918, quando foi alvejado por pela inimiga Fanni Kaplan. Escapou com vida
do atentado, mas o ferimento não deixou de lhe minar gravemente a saúde. Em fins de 1921 manifestaram- se nele sintomas de arteriosclerose. Em 26 de maio
de 1922 teve ele seu primeiro derrame cerebral. No dia 2 de outubro do mesmo ano, voltou a freqüentar, com intermitência e apenas por algumas horas, seu gabinete. A 16 de dezembro ainda do mesmo ano teve um segundo derrame, que lhe deixou paralisados o braço e a perna do lado direito. Depois disso, teve apenas mais um ano de vida, vindo a falecer a 21 de janeiro de 1924, no vilarejo de Górki, nas proximidades de Moscou.
de 1922 teve ele seu primeiro derrame cerebral. No dia 2 de outubro do mesmo ano, voltou a freqüentar, com intermitência e apenas por algumas horas, seu gabinete. A 16 de dezembro ainda do mesmo ano teve um segundo derrame, que lhe deixou paralisados o braço e a perna do lado direito. Depois disso, teve apenas mais um ano de vida, vindo a falecer a 21 de janeiro de 1924, no vilarejo de Górki, nas proximidades de Moscou.
O Stálin que bajulava Lênin, que citava suas frases como se fossem textos das Sagradas Escrituras, que tomava sempre, nas
reuniões do governo e do Comitê Central, o partido de Lênin, chegou ao posto de
secretário-geral do Partido e, a partir dessa posição, passou a dominar também
o aparelho de
Estado, inclusive sua polícia secreta. Quando se sentiu plenamente consolidado no poder, procedeu como todo carreirista: sua arrogância não tinha limites e suas grosserias atingiram até Krúpskaia, mulher de Lênin, provocando nesta amargas queixas.
Estado, inclusive sua polícia secreta. Quando se sentiu plenamente consolidado no poder, procedeu como todo carreirista: sua arrogância não tinha limites e suas grosserias atingiram até Krúpskaia, mulher de Lênin, provocando nesta amargas queixas.
Quando Lênin morreu, e apesar de ter recomendado em seu
testamento que se encontrasse um meio de “transferir Stálin desse posto”, já
era tarde para fazê-lo. Stálin se achava com um “poder ilimitado” e era
inarredável da secretaria-geral. O mais que se conseguiu foi colocar a seu
lado, com ele formando a direção do governo, Zínoviev e Kámenev. Mas não tardou
Stálin a se livrar dessa “incomoda” companhia. Dominando o aparelho do Partido,
toda a imprensa, deturpou os argumentos e propósitos de quantos tivessem a petulância de divergir dele, formando assim
uma “opinião pública”.
Em breve Kámenev e Zínoviev se passaram para o lado de Trotsky,
nessa luta interna. E em breve também Stálin obteve a expulsão (novembro de
1927) de Trotsky e seus partidários do Partido Bolchevique.
No XV Congresso do PC, em dezembro daquele mesmo ano,
Kámenev e Zínoviev capitularam diante dos stalinistas e pediram para voltar às
fileiras do partido como simples membros.
Trotsky foi então desterrado para o Turquestão, na Ásia
Central, em janeiro de 1928, sendo mais tarde seguido para o exterior. Aliás, depois
de percorrer vários Estados, nunca aceito para residência, radicou-se no
México, onde o braço longo da polícia stalinista foi mata-lo em 21 de agosto de
1940, em Coyoacan. O assassino foi Jacques Monard van der Dresche, a rigor, o catalão Ramón Mercader, voluntário
das Brigadas Internacionais da Guerra Civil Espanhola e encarregado de
executá-lo. (Nota 1).
Quanto a Kámenev e Zínoviev, permaneceram na Rússia, mas tiveram menos anos de vida ainda que Trotsky. Kámenev fui executado com um
tiro na nuca dentro da cela em que se encontrava preso, em 1936. Zínoviev teve
o mesmo destino: preso, torturado, falsamente julgado e fuzilado.
Eles eram
acusados, entre outras coisas, de haver
sido os autores intelectuais do assassinato do dirigente Kírov, em Leningrado, a 1.° dezembro
de 1934. Vale lembrar que esse assassinato, segundo revelou o relatório de Kruchev, foi tramado em verdade pelo
próprio Stálin, enciumado com a popularidade daquele líder bolchevista.
Entre as vítimas do totalitarismo de Stálin
encontravam-se revolucionários tão eminentes como o antigo premier (Primeiro-ministro)
soviético Ríkov; dois antigos presidentes da Internacional Comunista, Zínoviev
e Nicolai Ivânovitch Bukhárin (cuja capacidade teórica despertava entusiasmos em Lênin); o outrora temível G. G. Iagoda, chefe da OGPU (sigla da polícia secreta que
substituiu a Tcheka); o Marechal Tukatchévski, herói do exército vermelho; mais sete generais; além de ex-ministros, diplomatas e tantos outros filhos da revolução bolchevista.
3. O Relatório do XX Congresso do PC Russo sobre Era do
Stalinismo, de 1956.
Recordemos aqui alguns
trechos do relatório apresentado
por Kruchev durante o XX Congresso do PC soviético em 1956:
"A comissão tomou conhecimento
de uma grande quantidade de material dos arquivos da NKVD (nova sigla da
polícia secreta, que substituiu a OGPU - OP) e outros documentos, e estabeleceu numerosos fatos relativos à ‘fabricação’ de processos contra comunistas, falsas acusações, abusos contra a legalidade
socialista, que tiveram como
conseqüência a morte de inocentes.
Tornou-se evidente que numerosos ativistas do Partido, dos
sovietes, e da economia, que tinham sido tratados
como inimigos, em 1937-1938, não tinham sido jamais nem inimigos nem espiões, nem sabotadores,
mas sempre honestos comunistas. Haviam sido acusados de crimes. E, muitas vezes, incapazes de suportar mais tempo as torturas bárbaras, acusavam-se a si próprios (por ordem dos juízes de instrução, falsificadores de todas as espécies de crimes graves
e improváveis).
sovietes, e da economia, que tinham sido tratados
como inimigos, em 1937-1938, não tinham sido jamais nem inimigos nem espiões, nem sabotadores,
mas sempre honestos comunistas. Haviam sido acusados de crimes. E, muitas vezes, incapazes de suportar mais tempo as torturas bárbaras, acusavam-se a si próprios (por ordem dos juízes de instrução, falsificadores de todas as espécies de crimes graves
e improváveis).
A comissão apresentou ao Presidente do Comitê um material
importante e documentação relativos às repressões maciças contra os delegados
do XVII Congresso do Partido, e contra os membros do Comitê Central eleitos nesse
congresso. (...) Dos 1996 delegados do XVII Congresso, seja com direito a voto
ou opinião consultiva, 1108 pessoas, isto é, nitidamente mais que a maioria,
foram presas sob acusação de crimes contra a revolução”.
E mais adiante:
“Esse terror era, na realidade, dirigido não contra os
vestígios das classes exploradoras vencidas, mas contra honestos trabalhadores
do partido e do Estado soviético; assacavam-se contra eles acusações
mentirosas, difamatórias e absurdas de ‘hipocrisia’, de ‘espionagem’, de ‘sabotagem’,
de preparação de imaginários complôs”.
Era assim que a era stalinista devorava moral e
fisicamente seus melhores filhos.
4. A Visão Míope do Legado da Traição.
Não tenho lá muitas ilusões para o futuro. Para as
gerações de comunistas que se seguiram (e continuam a surgir), Stálin aparece
com cores mais amenas. Seletivamente escolhe-se, por um lado, que ele ajudou a
fazer a revolução de 1917; derrotou o nazismo do seu país e de imensa parte da
Europa, industrializou a Rússia, mecanizou a agricultura, e converteu a URSS
numa potência econômica e militar. Pelo outro lado, apaga-se da memória que ele
comandou a opressão, encarcerou e fuzilou; criou o terror, a degradação das
almas, o ambiente de delação e servilismo.
A era do stalinismo foi, dentro e fora da URSS, em todo o
movimento comunista mundial, a era das resoluções unânimes, do monolitismo, a
era das carreiras e dos burocratas.
Aliás, marca maior do stalinismo é a coexistência
pacífica e pragmática com o capitalismo.
A marca de Stálin está presente em vários companheiros
comunistas e suas posturas. Cito como exemplo o traço da circunspecção: o riso
e o prazer foram como que convertido numa debilidade de origem burguesa. É
quase que, implicitamente, proibido rir, pois mostra um camarada recalcitrante
ou vacilador. O riso, quando permitido, é para acolher a tirada (algumas vezes
sem graça, mas fazer o quê?!) de um Chefe.
Nota 1: interessante livro “O Homem que Amava os
Cachorros”, do cubano Leonardo Pandura, está “no mercado”, cujo enredo retoma
os últimos anos da vida de Trotsky, seu assassinato e a história de seu algoz,
o catalão Ramón Mercader, voluntário das Brigadas Internacionais da Guerra
Civil Espanhola e encarregado de executá-lo.
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