A IDEOLOGIA E OS INTERESSES ECONÔMICOS DE ALGUNS AMBIENTALISTAS E ORGANIZAÇÕES ECOLÓGICAS.
RESUMO: A partir da exposição, em
linhas gerais e diretas, do pensamento do filósofo Slovoj Zizek sobre o
movimento ambientalista, utilizo-o para submeter à crítica a ideia de que uma
grande contribuição está sendo feita se cada um cuidar do seu lixo, pois tal parece
ser a ideia preponderante em certo segmento social brasileiro. Com isso, alcança-se
que aquela forma de pensar oculta a dimensão política envolvida na crise ambiental.
Além disso e de modo secundário, isso expõe argumentos contrários a certos
segmentos ambientalistas de organizações internacionais e seus representantes
políticos, tal como a novel candidata Marina Silva.
Jornal O Estado de São Paulo, em 28/09/2011 |
1. INTRODUÇÃO
A
concepção deste texto surgiu de um fato corriqueiro: a instalação de lixeiras
que separam o lixo orgânico do lixo seco em condomínios e cidades.
Especificadamente, a minha percepção de que isso já transmitia a mensagem de
que há uma transformação do indivíduo que separa e limpa o lixo antes de
colocá-lo nas respectivas lixeiras (sic) em sujeito que contribui e participa
da melhoria do Mundo. Ou seja, em indivíduo que em sua microação ajuda a salvar
o Planeta.
A
questão é que todo o lixo doméstico produzido no Mundo (sim, estão incluídos os
EUA, Comunidade Européia e China) representa aproximadamente 2,5% do lixo
produzido no Mundo, de modo que é pífia a participação do lixo doméstico para a
poluição planetária. (1 Nota: E faço questão de só utilizar neste texto dados e
fontes dos que defendem a indústria, agronegócio, finanças e órgãos oficiais do
sistema capitalista. Isso trará mais “legitimidade ao texto” e “o sabor” das
contradições do sistema).
E
antes de continuar, alguns avisos aos navegantes:
(i)
Não argumente que “3% é melhor do que não fazer nada”, pois há 2 notórios
equívocos: (a) até agora ninguém falou em “não fazer nada” ou “que não se defende
a coleta seletiva de lixo doméstico”. Busque uma terapia para cuidar dessa
esquizofrenia (ouvir, ou ler, o que não foi dito. São vozes e imagens
inexistentes, salvo na tua mente) e (b) 2,5% de produção de lixo doméstico no
Planeta (e não 3%) não é capaz de sustar, ou significativamente retardar,
qualquer agressão a Natureza. Novamente aconselho-o: vá estudar um pouco de
física e matemática (pode ser a ensinada no ensino médio), para tentar resolver
aqueles problemas que também envolvem tempo e quantidade sobre encher uma
piscina com “x” metros cúbicos diante de uma vazão de “y” e escoamento de “z”.
(ii)
Ainda nesse mês de agosto/2014, houve debates sobre o final do prazo de
desativação dos lixões (cumprimento da Lei 12.305, que instituiu a Política Nacional
de Resíduos Sólidos), e diversos dados (com quantidades astronômicas de lixo)
surgiram. Tal fato não modifica o argumento: a produção de lixo doméstico não é
o vilão da história ao se considerar a totalidade do problema.
(iii)
Isso não significa que estou me opondo a adoção da coleta seletiva de lixo. A
armadilha é o pensamento “como você pode ser contra a coleta seletiva de
lixo?”. Não tenho dúvidas de que, em uma dada localidade, a coleta de lixo
livra aquela comunidade de grandes lixões, quiçá a céu aberto. O que questiono
é a percepção automática de que o indivíduo que faz a coleta seletiva de lixo
doméstico está “fazendo a sua parte”. Isso é ideológico e tem razão de ser
nessa sociedade capitalista, pois coloca o problema como consciência e ação de
cada indivíduo em seu mundinho (doméstico), em vez de serem entendidos como
questões de opressão, exploração e iniquidades. Lembre-se: o escopo do texto é
submeter à crítica a invisível mensagem que diz que o indivíduo que separa e
limpa o lixo antes de colocá-lo nas respectivas lixeiras (sic) é sujeito que
contribui e participa da melhoria do Mundo. Ou seja, em indivíduo que em sua
microação ajuda a salvar o Planeta.
(iv)
Por fim, devo dizer que outras questões estão ausentes neste texto, mas não
esquecidas. Daí que elas merecem análises separadamente, tais como, se a coleta
seletiva de lixo doméstico é (ou não) um outro nicho de mercado a ser
explorado? E mais, trata-se (ou não) apenas de criação de “novas” mercadorias a
serem mercantilizadas, similar (ou não) ao mercado de crédito de carbono?
Trata-se de “incorporação por naturalização laboral” da atividade até então de
mera sobrevivência do catador dos lixões? Isso é dignificante para o jurídico
princípio de dignidade da pessoa humana, na esfera laboral? Qual a interação
dessa nova atividade laboral na chamada inclusão social e precarização das
relações do mundo do trabalho?
Este
texto estava em gestação, cujo parto prematuro nessa ocasião deriva
evidentemente da conjuntura eleitoral. Explico: a entrada de Marina Silva e
seus ecologistas internacionais (WWF, Greepeace entre outros) na disputa
eleitoral neste ano (Eleições Gerais 2014). Evito a todo custo debater
conjuntura, por minha máxima incapacidade de fazê-lo, e não porque reputo de
menor importância. Todavia, meus argumentos em desfavor daquela candidata se
fazem por questão ética-política, uma vez que tenho enormes dificuldades (deve
ser a incapacidade de examinar conjuntura) de entender porque:
(i)
Neca do Itaú não pode, mas Meirelles do Bank of Boston pode apoiar candidatos;
(ii)
Guilherme Leal da Natura não pode, mas José de Alencar (sem nenhuma relação com
a Iracema da minha terra) pode apoiar candidatos;
(iii)
o caráter evangélico de Marina (e as trevas do feudalismo) não pode, mas os
neopentecostais da CONCEPAB pode apoiar candidatos;
E
mais, as importantes questões que Marina aponta sobre ser “contra a política”,
“os melhores e elites” e suas fraseologias são elementos fundamentais para
mostrar o vazio dela, mas eu precisava ir além dessas nítidas características
da candidata. A criança então se apressou, e nasce com 7 meses.
2. “A Ecologia é o Ópio do Povo”, DE Slavoj Zizek.
Zizek
identifica a questão do meio ambiente como uma das mais importantes áreas da
luta política nos dias atuais. Isso se deve a crescente crise ambiental global
e aos descasos com que os Países lidam com o problema. Diante disso, Zizek
propõe uma abordagem radical como forma de solução.
Ele
nos diz que para começar é preciso uma forma de pensar completamente diferente
das nossas principais ideias sobre a Natureza. Zizek argumenta que o pensamento
e as atitudes atuais, acerca do meio ambiente, são profundamente conservadoras,
nitidamente mostrando que o que se pensa e como se defende a atuação sobre a
Natureza é ingênua, romântica, quase espiritual. Parafraseando famosa frase de
Karl Marx, ele declara: “A ecologia é o novo ópio das massas, que substitui a
religião”.
Zizek
fala que a ideologia cristã e romântica são vetores que orientam as ideias
sobre a Natureza, especialmente as ideias do segmento liberal que se interessa
pelo tema. Nessa concepção, a Natureza é vista como harmoniosa e benfeitora. A
Natureza assume o papel de “Mãe Terra”, representando uma figura benévola e que
nos nutre. Todavia, hoje em dia o “equilíbrio natural” da bioesfera está
profundamente sofrível devido aos resíduos tóxicos, poluentes e o aquecimento
global.
“A
resposta tipicamente liberal a essa perturbação diz: nossa exploração dos recursos
naturais é pegar emprestado do futuro... por isso devemos tratar nossa terra
com respeito, em última instância, como algo sagrado, não devemos revelá-la
completamente, mas ela deve permanecer um mistério para sempre”. (2)
Para
o liberal, é como se o aquecimento global fosse uma violação à Terra sagrada,
por isso mesmo somos responsáveis por isso e somos também culpados. Para o
liberal, a lição que o ser humano deve aprender é que a humanidade deve agir
cuidadosamente em seu trato com a Terra.
“A
lição de que é constantemente martelada pelo liberalismo é sobre nossa
finitude: somos seres finitos embutidos na biosfera, que transgride muito nosso
horizonte... Temos de reconhecer que não podemos ter controle absoluto sobre a
nossa biosfera, mesmo se ela estiver em nosso poder, de modo a inviabilizar e
perturbar o seu equilíbrio” (idem 2).
Essa
abordagem de cautela na relação entre humanidade e Natureza opera da mesma
forma que a religião, representando uma autoridade inquestionável mediante a
imposição de limites sobre o que podemos conceber de nós mesmos.
Dando
conta das ideias liberais sobre a ecologia, Zizek assinala que a Natureza está,
na realidade, composta de grandes quantidades de destruição e instabilidade.
Sobre esse tema ele acredita que a teoria da evolução proposta por Charles
Darwin estava equivocada: “Darwin acreditava que os planos da natureza são perfeitamente
polidos: fazer o que deve ser feito, de modo a permitir que os animais possam
ver, alimentar e nutrir-se do sol. Não! A Natureza salta e improvisa, com
grandes catástrofes que acompanharam cada êxito limitado. Na realidade, a
evolução está composta de uma série de catástrofes e desastres, e a evolução
quebrada e improvisada são partes de nossa história. Em cada ponto da história
da Natureza as coisas podiam ter sido diferentes e, consequentemente, ter sido
constituído resultados diferentes.” (idem 2).
Como
que para reforçar essa tese, Zizek assinala que o petróleo e a energia daí
oriunda, que tanto dependemos nos dias atuais, é constituído de um desastre
natural prévio e de dimensões inimagináveis. E indaga: “se a evolução está tão
perfeitamente desenhada, como é possível que 99% do genoma humano seja DNA
lixo?” Parafraseando a audaciosa declaração de Lacan “a mulher não existe”,
Zizek diz: “a Natureza não existe”.
A
declaração de Lacan, como todos sabem, é um contraponto a visão patriarcal e
idealizada das mulheres. Igualmente, a intenção de Zizek é contestar as ideais
místicas, sentimentais, ingênuas, românticas de um Mundo equilibrado, onde a
humanidade perturbou a ordem natural, mas que é possível de alguma maneira
retomar o caminho certo. Ou seja, a reação liberal da crise ecológica é tratar
de encontrar um caminho de volta ao equilíbrio natural da Terra. Ocorre que
para Zizek isso é uma forma de iludir a verdadeira dimensão da crise. (3)
Uma
das primeiras lições que devemos aprender da crise ecológica, diz Zizek, é
renunciar a todas as ideias sentimentais, ingênuas e românticas do universo: a
humanidade não tem, e nunca teve, uma plataforma equilibrada natural ao qual
possa retomar. Para Ele, nossa existência é absolutamente contingente e está
muito além do nosso pleno controle. (idem 3).
E
mais, a crise ambiental oferece a mais estrita experiência da existência vazia
e sem sentido da humanidade. Isso é importante, uma vez que elimina qualquer
tipo de ideia residual, romântica, religiosa sobre nós mesmos e o Mundo em que
vivemos. (idem 3).
Ainda,
nos permite confrontarmos com os sistemas globais e nossa própria relação com
ele (não importa tão dramático isso seja) de uma maneira mais aberta e flexível.
Esclareço
que apesar de desencantada essa visão de Zizek, ele não é um melancólico que
meramente afirma da “falta de sentido da existência”. É um ativista que
acredita que se deve fazer algo urgentemente sobre a crise ambiental.
Logo,
Zizek propôs um manifesto ecológico que sintetiza, de modo audacioso, em 4
pontos um vigoroso programa de mudança política e ação coletiva. A saber:
1)
Uma imposição de normas mundiais de consumo de energia elétrica per capita e de
emissões de CO2; as nações desenvolvidas não poderiam continuar a envenenar o
Mundo no ritmo atual, enquanto colocam a “culpa” nos países em desenvolvimento
ou pobres, desde Brasil até a China, de arruinar o meio ambiente por causa da
política de desenvolvimento.
2)
Uma punição implacável para aqueles que violarem as medidas de proteção
impostas, incluindo limitações as liberdades liberais e controle tecnológico de
possíveis fatores;
3)
A implantação de decisões coletivas em larga escala para contrariar a lógica
espontânea do desenvolvimento capitalista ... para parar o trem da história que
corre para o precipício de uma catástrofe global;
4)
E por último, mas não de menor importância, que tudo isso seja combinado com a
confiança do povo, com a aposta de que a grande maioria das pessoas apoiam essas
severas medidas e as enxergam como próprias, inclusive, estão dispostos a
participar da sua aplicação.
3. OS MAIORES
POLUIDORES
É
necessário lembrar que a questão da poluição, na atualidade, é tratada segundo
o principio da responsabilidade comum e também diferenciada. A responsabilidade
é comum porque depois de duas semanas, os gases poluentes são misturados na
atmosfera de forma homogênea, ou seja, a poluição de um determinado país irá
conseqüentemente atingir um outro mesmo que este esteja a uma distância
significativa. A responsabilidade é diferenciada por sua vez pois, obviamente
alguns países poluem mais que outros, e sua população irá sofrer um maior
impacto a curto prazo do que outras partes do globo.
Então,
as duas figuras abaixo demonstram os países que mais poluem no Mundo em dois
momentos distintos. O primeiro no ano de 1990 (antes da Agenda 21 das Nações
Unidas) e 2006 (depois da Agenda 21), de modo que não há uma mudança
significativa no mapa dos poluidores do Mundo. Ao contrário, o volume emitido
pelos países que eram líderes de poluição continuou aumentando. Ou seja, em
1990 a quantidade de gases CO2 era de aproximadamente 17 milhões de Toneladas,
passando para aproximadamente 29 milhões em 16 anos, isto representa que a
quantidade de gases quase dobrou, com aumento de 63,95% nesses 16 anos. (4)
Por
sua vez, os países que mais poluem o Planeta segundo a Agência Netherlands Environmental Assessment são os
seguintes: China, EUA, União Europeia, Rússia e Índia. E como se vê no gráfico
abaixo, a poluição é mais concentrada em dois únicos países, China (responsável
por 32% da poluição mundial) e EUA (responsável por 30%).
Para
que se tenha uma ideia, no ano 2006, a China jogou no ar algo ao redor de 6.075
milhões de toneladas de CO2 e os EUA 5.808 milhões de toneladas de CO2.
3.1 DE ONDE VEM A
POULIÇÃO DO PLANETA
Pode-se
transcrever aqui a voz do Patrão (5): “Responsáveis pela produção anual de
cerca de 4 bilhões de toneladas de lixo no mundo, as cidades representam apenas
2,5% do total de resíduos gerados no planeta - que atualmente estão em torno de
30 bilhões de toneladas/ano. A maioria é produzida pela pecuária, agricultura e
mineração.
Para
cada saco de lixo produzido em nossas casas, há outros 60 que já foram gerados
antes", estima o sociólogo Maurício Waldman, doutor em geografia e autor
do livro Lixo - Cenários e Desafios (Ed. Cortez, 2010), indicado ao Prêmio
Jabuti neste ano na categoria Ciências Naturais.
Apesar
de constituírem a menor parte do lixo produzido no mundo, os resíduos sólidos
urbanos ainda são um problema sério em países como o Brasil. ‘Nós mandamos para
a compostagem apenas 2% do lixo orgânico urbano e reciclamos 13% da parte seca’,
diz Waldman. Para efeito de comparação, a Índia, outro emergente, faz
compostagem de 65% de seu lixo orgânico. ‘Agora se fala em políticas para lidar
com o metano, gás gerado nos aterros. Mas temos de evitar que ele seja gerado,
mandando o mínimo possível para o aterro.’
O
Brasil, que abriga 3% da população mundial, gera 5,5% do lixo do planeta. ‘Em parte
porque o País está exportando commodities como minério, grãos, carne, etc. A
mineração é responsável por 38% do lixo gerado no mundo e a pecuária e agricultura,
juntas, por 58%’, diz Waldman.
3.2 CONSIDERAÇÕES FINAIS:
A IDEOLOGIA E OS INTERESSES ECONÔMICOS DE ALGUNS AMBIENTALISTAS E ORGANIZAÇÕES
ECOLÓGICAS.
Os
dados fornecidos neste texto indicam que o Brasil produz 5,5% da poluição
mundial. E que a poluição que contamina o Mundo é produzida pelos seguintes
setores econômicos: agricultura, pecuária, mineração, indústria. Sendo que a
concentração dos poluidores se dá de modo mais acentuado em 2 únicos países,
China e EUA.
Evidentemente
que “somos todos viajantes dessa mesma nave, chamada Terra” e, por isso, “somos
todos responsáveis pelo meio ambiente”. Bonito né? O problema dessa frase é que
ela esconde o real problema (sic). As frases mistificam a questão, justamente
por serem muito obvias, daí desnecessárias, senão para esconder, ou ocultar,
propositadamente interesses econômicos. Assim, ao se focar a discussão sobre a
reciclagem do lixo domestico (que é 2,5% do lixo produzido no mundo), omite-se por
completo o debate sobre o consumo e os meios de produção da sociedade
capitalista, daí ser um discurso estrategicamente produzido para
despolitizar a questão ambiental.
Não
é a toa a linguagem mercantil e categorias de “trocas” que giram ao redor de
muitos ambientalistas. Alguns exemplos:
O
conceito de “país devedor ecológico” foi concebido pelo World Wildwilf Fund
(WWF), para aqueles países que demandam do meio ambiente mais do que seus
ecossistemas são capazes de oferecer. Este pressuposto sinaliza para os perigos
ambientais e de consumo que o homem vem adotando. O Relatório Planeta Vivo tem
sido publicado a cada dois anos desde 1998, e visa mostrar como estão os
recursos naturais e o impacto exercido por atividades humanas. O relatório do
ano de 2008 cita nominalmente três paises como devedores ecológicos: os Estados
Unidos, a China e a Índia. Nestes paises, a demanda por recursos naturais e os
resíduos lançados é maior do que podem oferecer e absorver. (6)
Posteriormente
houve mera alteração linguística, que passou a ser chamada de “pegada
ecológica”. O relatório planeta vivo 2012 (7) já acentua: “A diferença entre
países ricos e pobres também é sublinhada no relatório. Países com altos
rendimentos têm uma Pegada Ecológica, em média, cinco vezes maior do que os
países de baixos rendimentos. Os dez países com maior pegada ecológica são:
Qatar, Kuwait, Emirados Árabes Unidos, Dinamarca, Estados Unidos da América,
Bélgica, Austrália, Canadá, Holanda e Irlanda. O Brasil aparece na 56ª posição.”
E
já menciona o comércio do meio ambiente: “(...) No entanto, é importante notar
que esta biocapacidade pode muito bem ser exportada e utilizado por outras
nações”. Ou seja, o Brasil, segundo este mesmo documento, é considerado como
“país credor ecológico” ou com “pegada ecológica dentro de sua capacidade”,
pois ainda possui mais recursos naturais do que consome, podendo até exportar
sua biocapacidade para países devedores. Na linguagem neoliberal econômica: a
nossa vantagem comparativa nas trocas internacionais é ficar conservando as
florestas para recebermos por isso...
E
o relatório 2012 “explica” como se deve garantir o futuro do Planeta: “As Florestas
são importantes para o armazenamento de carbono e estabilização do clima. O
serviço de armazenamento de carbono fornecido pelas florestas do mundo é vital
para a estabilização do clima. A quantidade de carbono armazenado em florestas
diferentes varia: As florestas tropicais armazenam mais carbono. Quase metade
desse carbono acima do solo é nas florestas da América Latina, com 26 por cento
na Ásia e 25 por cento em África”. (idem 7).
Veja
alguns outros trechos do Relatório Planeta Vivo 2012 da WWF:
“Este
relatório é como um check-up planetário e os resultados indicam que temos um
planeta muito doente (...) Ignorar este diagnóstico terá implicações
importantes para a humanidade. Podemos restaurar a saúde do planeta, mas apenas
através da resolução das causas mais profundas, como o crescimento populacional
e o excessivo consumo. O relatório evidencia ainda o impacto da urbanização
como uma dinâmica em crescimento – em 2050, duas em cada três pessoas viverão
numa cidade; evidencia, por outro lado, a necessidade da humanidade desenvolver
novas e melhores formas de gerir os recursos naturais. (...) Podemos criar um
futuro próspero que ofereça comida, água e energia para os 9 ou talvez 10
bilhões de pessoas que estarão a partilhar o planeta em 2050 (...) As soluções
centram-se em áreas como a redução de resíduos, gestão inteligente da água e
utilização de fontes de energia renováveis que sejam limpas e abundantes – como
a eólica e a solar. (...)
E
aqui pode-se retomar as teses de Zizek: a ecologia (junto com todos os
problemas que ela trata) é uma nova religião – o novo ópio do povo. Por quê?
Porque se trata de uma problema que engloba tudo e todos (a humanidade), que
está além do âmbito social (afinal, a natureza não é considerada como um
produto social, mas como algo em-si) e que nós, enquanto indivíduos, já
carregamos culpa desde de que nascemos, pois somos parasitas do planeta Terra.
(8)
Com
esta visão, Zizek tenta mostrar que toda a política se transforma em
administração, pois todos se encontram do mesmo lado, todos têm os mesmos
pressupostos, não há outra opção nem outra alternativa possível. Tudo é utopia
irrealizável. Desta forma, o discurso ecológico é apresentado como mais uma
maneira de desfocar essas lutas estruturais para um problema agregador, um problema
global, da humanidade, um problema de uma sociedade que não tem mais problemas
político-sociais estruturais. O cidadão comum faz sua parte e temos a supressão
dos antagonismos de classe e conflitos de interesses econômicos. Tudo é uma
questão “dos governos, empresários e cidadãos fazerem suas tarefas”. Em outras
palavras, parece que não há mais motivo para realizar lutas político-sociais,
pois todos os problemas podem ser resolvidos democraticamente. Basta bom-senso
(idem 8).
4. ANEXO: O QUE O
MARXISMO TEM A NOS DIZER?
Em
resposta à ideologia de
alguns ambientalistas da religião (de culpa e de medo com frases “vamos
destruir tudo e o Planeta vai acabar”), e das soluções gerenciais de
organizações ecológicas (e de suas candidatas Marina), tais como sobre a oferta
de alimentos, produção de lixo doméstico, o pensamento marxista pode voltar-se
para identificar o falso
problema, ideologicamente a serviço de uma classe
social.
O
pensamento marxista deve dissolver o problema raciocinando na perspectiva da classe operária. Assim, na perspectiva da burguesia é gente demais
na Terra. Na perspectiva da classe trabalhadora
é produção de menos, emprego de menos, portanto, sob sua direção o problema
deixa de existir. Teórica e praticamente. Deve-se
controlar os meios de produção
e planifica-los.
Com alguns ramos dos ambientalistas, a “solução” é manter a exploração por um
lado (Países
comprando/vendendo créditos de carbono e/ou sua Pegada Ecológica) e executar “leis antipobreza” para
exterminar os “excessos” de pobreza do outro...
Aliás,
os “verdadeiros” ecologistas como Marina Silva não
atacam as relações de produção. Pretendem a utopia reacionária de uma melhor
distribuição da produção com base no progresso material. Viva a tecnologia
(para seu desfrute privilegiado e para o lucro) e viva uma justa distribuição
do produto: eis o socialismo burguês. Ignora que sob o capitalismo o progresso
material resulta ser anti-operário e contra a humanidade, através de seus
efeitos negativos determinados pelo objetivo do lucro. A produção é para o lucro (não para a distribuição
socialmente justa), coisa que só cabe imaginação dos utópicos.
Por
meio do pensamento marxista, temos pela primeira vez articulada uma concepção
materialista dialética de Natureza com uma concepção de sociedade. Isso permite
uma concepção de Natureza mais profunda, que integra a relação social e
alienada da sociedade com a Natureza. Explico:
Sobretudo
no “Manifesto Econômico Filosófico” de Marx, vai sendo posta a concepção
materialista de Natureza de Marx, lado a lado com a concepção da alienação do
homem em relação a Natureza, da centralidade do trabalho na gênese do homem e
portanto da autoatividade humana ou da práxis como elemento central para
compreender Natureza e sociedade. Basta que se considere o processo a partir do
momento histórico em que não há mais história natural pura e simplesmente
(processo que se dá com o aparecimento das sociedades humanas). A transformação
humana da Natureza ganha finalmente uma compreensão profundamente dialética. E
exclui toda metafísica. É o materialismo marxista. É a concepção marxista de Natureza
(e do materialismo histórico) que o permite ser ecologicamente comprometido e
que permitirá a crítica do Marx de O capital (mais maduro) sobre a
insustentabilidade da agricultura movida pelo lucro (agronegócio no capitalismo
brasileiro), das indústrias etc.
E mais:
inseparável de sua defesa do planejamento da relação homem natureza através dos
“produtores associados” (como ele designa o controle social e da produção pelos
trabalhadores).
Logo,
entendo que o marxismo já era atento para as conseqüências negativas do capitalismo
para a sociedade e a Natureza. O materialismo histórico e dialético desponta
como alternativa analítica para a crise ambiental, superando todo enfoque “verde”,
“ecológico” ou daqueles que não se davam conta do marxismo como devidamente
inserido no debate ambiental.
Referência:
(1) Jornal O Estado de São Paulo.
Disponível em < http://www.estadao.com.br/infograficos/de-onde-vem-o-lixo-produzido-no-mundo,148028.htm>.
(2) ZIZEK, S. Violência: seis
reflexões laterais. São Paulo:Editorial Boitempo, 2014.
(3) ZIZEK, S. Vivendo no Fim dos
Tempos. 1º Ed. São Paulo: Editorial Boitempo, 2012.
(4) MATTE, M.R.G. Desenvolvimento
Sustentável: uma análise das emissões de CO2 no cenário mundial antes e depois
da Agenda 21. TFC – 2011, UFRGS.
(5) Jornal O Estado de São Paulo.
Disponível em http://www.estadao.com.br/noticias/geral,cidades-geram-apenas-2-5-do-lixo-do-planeta-imp-,778541
.
(6) Site da WWF e o Relatório
Planeta Vivo 2008. Disponível em < http://www.wwf.org.br/natureza_brasileira/especiais/relatorio_planeta_vivo/>
(7) Relatório Planeta Vivo da
WWF. Disponível em < http://awsassets.panda.org/downloads/relplanetavivo2012sumario.pdf>
E mais: < http://www.institutocarbonobrasil.org.br/noticias6/noticia=730522>
(8) ECOLOGIA, A NOVA RELIGIÃO SEGUNDO SLAVOJ
ZIZEK. Blog Obvious. Disponível em < http://obviousmag.org/archives/2013/03/perspectivas_sobre_ecologia_de_slavoj_zizek.html>
Comentários
Postar um comentário
Você irá comentar em Sociedade, Poder e Direito na Contramão