MARXISMO E RACISMO
RESUMO: Este texto sustenta que Karl Marx destacou
três coisas sobre o racismo: primeiro, que o capitalismo promove a
concorrência econômica entre os trabalhadores, de modo que o racismo é uma de
suas modalidades; segundo, que a classe dominante utiliza a ideologia
racista para dividir os trabalhadores uns contra os outros; e, finalmente,
que, quando um grupo de trabalhadores sofre opressão, ela afeta negativamente
toda a classe trabalhadora.
O pensamento marxista
argumenta que o capitalismo é um sistema que se baseia na exploração de muitos
por poucos. Porque é um sistema baseado na desigualdade bruta, ele exige
várias ferramentas para dividir a maioria. O racismo e todas as opressões do
capitalismo valem-se desse propósito.
Além disso, a opressão é
usada para "explicar" as relações desiguais na sociedade que
enriquecem a minoria que vivem de trabalho da maioria. Assim, o racismo foi desenvolvido
inicialmente para explicar e justificar a escravização de africanos - porque
eles eram menos que humanos e não merecedores de liberdade e autonomia.
Ou seja, o capitalismo
usou o racismo para justificar a pilhagem, a conquista e a escravidão. Mas como
apontou Karl Marx, ele também usou o racismo sob a ótica dividir para reinar -
para insuflar um setor da classe trabalhadora contra o outro, promovendo corte
na consciência de classe.
Aliás, apesar
das crenças generalizadas dos críticos a Karl Marx, ele estava bem consciente
da centralidade da raça sob o capitalismo. Explico.
Muito embora Marx não
tenha escrito objetivamente sobre a questão da escravidão e seu impacto racial
nas sociedades, ele escreveu sobre a maneira pela qual o capitalismo europeu
surgiu por causa de seu furto, estupro e destruição:
“A descoberta de ouro e
prata na América; a extirpação, escravização e sepultamento nas minas da
população aborígine; o início da conquista e pilhagem das Índias Orientais; a
transformação da África em um labirinto para a caça comercial de peles negras,
sinalizada a aurora da era da produção capitalista”.
Marx também
reconheceu que a escravidão era central para a economia mundial. “A escravidão
direta é tanto o pivô da indústria burguesa como as máquinas, créditos etc. Sem
escravidão, não haveria algodão; sem algodão, não haveria indústria moderna. Foi
a escravidão que deu as colônias o seu valor; são as colônias que criaram
o comércio mundial, e é o comércio mundial que é a pré-condição da indústria em
grande escala. Assim, a escravidão é uma categoria econômica da maior
importância. (...)
Sem a escravidão na
América do Norte, o mais progressista dos países, seria transformado em um país
patriarcal. Limpe para fora a América do Norte a partir do mapa do mundo,
e você terá anarquia - a completa decadência do comércio e da civilização
moderna. (...) Assim, a escravidão, porque é uma categoria econômica,
sempre existiu entre as instituições dos povos. As nações modernas têm
sido capazes apenas de disfarçar a escravidão em seus próprios países, mas eles
impuseram-lo sem disfarce sobre o Novo Mundo”.
Assim, há
uma compreensão fundamental da centralidade do trabalho escravo na economia
nacional e internacional por parte de Marx.
Em suma, apesar
da escassez de própria escrita de Marx sobre a raça em particular, pode-se
olhar para a correspondência e falas de Marx sobre a Guerra Civil Americana
para tirar conclusões quanto ao fato de que ele não foi tão dogmaticamente
focado em questões puramente econômicas, como seus críticos afirmam.
Pode-se levantar
a seguinte questão: Se Marx foi reducionista, como justificar seu eloquente apoio
envolvimento em lutas abolicionistas na Inglaterra? Se Marx foi realmente
um reducionista econômico, como ele poderia ter imaginado que a escravidão e o
capitalismo são incompatíveis, mas que o racismo serve para dividir a classe
trabalhadora?
Cite-se a carta escrita
por Marx, como chefe da Associação Internacional dos Trabalhadores, a Abraham
Lincoln, em 1864, no meio da Guerra Civil:
“(...) O concurso para
os territórios que abriram a época, não foi para decidir se o solo virgem de
extensões imensas devem ser apegada ao trabalho do imigrante ou ser prostituída
pelo vagabundo do condutor de escravos? Quando uma oligarquia de 300 mil
donos de escravos ousou inscrever, pela primeira vez nos anais do mundo ‘escravidão’
na bandeira da insurreição armada, quando nos mesmos lugares onde quase um
século atrás, a ideia de uma grande República Democrática tinha saltado
primeiro para cima, de onde foi emitida a primeira declaração dos direitos do
homem (...) quando nos próprios pontos de contra revolução (...) foi mantido ‘escravidão
a ser uma instituição benéfica’ (...) e propriedade cinicamente proclamou no
homem ‘a pedra angular da novo edifício’ (...) então as classes trabalhadoras
da Europa entendiam de uma vez (...) que os senhores de escravos se rebelaram e
fizeram soar o toque de alarme para uma guerra santa geral da propriedade
contra o trabalho (...).
Eles consideram um sério
sinal a questão ter caído no colo de Abraham Lincoln, o filho único de espírito
da classe trabalhadora, para conduzir o seu país através das lutas incomparável
para o resgate da raça acorrentada e a reconstrução de uma ordem social”.
Não só foi
Marx pessoalmente contra a escravidão e ativamente organizou a luta contra a escravidão,
mas ele teorizou que a escravidão e a discriminação eram apenas problemas não
só dos próprios escravos, mas de trabalhadores brancos que estavam
constantemente sob a ameaça de perder o trabalho para o trabalho escravo.
Isso não
significa, necessariamente, que os trabalhadores brancos eram simpáticos à
causa dos escravos - a maioria deles não foram. Mas Marx não queria
abordar a questão apenas sob o prisma da consciência de classe, mas por fatores
objetivos. Tanto que ele escreveu no O Capital: "Nos Estados Unidos da
América, cada movimento independente dos trabalhadores estava paralisada desde
que a escravidão desfigurou uma parte da República. O trabalho não pode
emancipar-se na pele branca, onde no negro ele é da marca".
Além disso,
Marx compreendeu a dinâmica do racismo em um sentido moderno: os trabalhadores
que têm interesses objetivos comuns, mas podem se tornar inimigos mortais por
causa da ideologia racista e nacionalista. Olhando para as tensões entre
os trabalhadores irlandeses e ingleses, com um aceno de cabeça em direção à
situação americana entre negros e brancos, Marx escreveu:
“Cada centro industrial
e comercial na Inglaterra possui uma classe trabalhadora dividida em dois
campos hostis, proletários ingleses e proletários irlandeses. O
trabalhador inglês comum odeia o trabalhador irlandês como um concorrente que
reduz o seu padrão de vida. Em relação ao trabalhador irlandês, ele se
sente um membro da nação dominante e por isso se transforma em uma ferramenta
dos aristocratas e capitalistas de seu país contra a Irlanda (...). Ele
preza preconceitos religiosos, sociais e nacionais contra o trabalhador
irlandês. Sua atitude é a mesma que a dos ‘brancos pobres’ para os ‘nigger’
nos antigos estados escravistas dos EUA. (...) Este antagonismo é mantido
artificialmente vivo e intensificado pela imprensa, o púlpito, os papéis
cômicos, enfim por todos os meios à disposição das classes dominantes. Este
antagonismo é o segredo da impotência da classe trabalhadora inglesa, apesar de
sua organização. É o segredo pelo qual o capitalista mantém o seu poder. E
que a classe está plenamente consciente disso”.
A partir
dessa citação, pode-se ver uma teoria marxista sobre como o racismo é operado
na sociedade contemporânea após a escravidão ter sido extinta. Marx destacou
três coisas: primeiro, que o capitalismo promove a concorrência
econômica entre os trabalhadores; segundo, que a classe dominante
utiliza a ideologia racista para dividir os trabalhadores uns contra os outros; e,
finalmente, que, quando um grupo de trabalhadores sofre opressão, ela
afeta negativamente toda a classe trabalhadora.
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